"O CLUBE FINLÂNDIA"
Por Helena Hilden, especial para a Rádio TV Penedo - Quando os finlandeses chegaram em Penedo em 1929, usavam a Casa Grande da Fazenda como ponto de reunião para discutir assuntos de trabalho e também para comemorações e atividades sociais.
Mas na década de 1940, com as dificuldades econômicas aumentando, Toivo Uuskallio foi obrigado a vender grande parte da Fazenda Penedo, incluindo a Casa Grande. Cada família finlandesa recebeu um terreno para cultivar e construir sua casa. As terras restantes foram vendidas para a empresa Plantas Medicinais SA – PLAMED.
Os finlandeses não viviam mais sob as ordens de Toivo Uuskallio, cada um precisava trabalhar e obter seu sustento. Muitos foram trabalhar para a Plamed, outros abriram pensões e pousadas, outros continuaram com agricultura e venda de produtos. Um grupo resolveu fundar uma cooperativa para criar galinhas e vender ovos. Como não precisavam mais seguir os preceitos veganos de Uuskallio, podiam criar animais.
Surgiu então a ideia de criar uma associação para encontros sociais e comemorações. Porém, a Europa estava envolvida na Segunda Guerra Mundial. A Finlândia foi atacada pela Rússia e se uniu com a Alemanha para se defender. Mas a Alemanha era inimiga do Brasil, então os finlandeses também eram considerados inimigos. Não podiam se reunir sem ter uma autoridade brasileira presente.
Também não podiam chamar a associação de Clube Finlandês, mas conseguiram permissão para fundar o Clube Finlândia, nome oficial usado até hoje embora seja conhecido popularmente como o “clube finlandês”. Para fazer as reuniões precisavam chamar uma autoridade brasileira e só podiam falar português. Os primeiros presidentes do Clube Finlândia eram brasileiros: Júlio Souza Pinto e Silvio Guimarães. Mas as autoridades brasileiras logo perceberam que os finlandeses não faziam nada contra o Brasil e liberaram as reuniões.
O Clube Finlândia foi fundado em 1942, mas seus primeiros estatutos foram registrados oficialmente em 1943. O primeiro baile do Clube Finlândia foi organizado no carnaval de 1942, realizado em um galinheiro novo da cooperativa dos criadores de galinhas.
A primeira sede do Clube Finlândia. Na foto Laura Suni e dois jovens finlandeses.
Os finlandeses logo trataram de construir uma sede para seu clube. Toivo Sipilä doou um terreno, na atual Avenida Finlândia. A única condição imposta por Sipilä foi que o Clube deveria organizar uma festa todos os anos no seu aniversário. Todos contribuíram como podiam para comprar os materiais para a construção. A sede foi construída em regime de mutirão pelos finlandeses, os homens trabalhando na obra, as mulheres fazendo café e comida e até trabalhando como serventes carregando material. Aproveitaram materiais da região, as vigas do teto foram feitas com troncos de palmito, uma árvore que sempre foi abundante na região.
A sede do Clube Finlândia foi inaugurada na festa de São João, Juhannus, em 1943. Essa comemoração se tornou tradição no Clube Finlândia, seria organizada todo ano durante muito tempo.
A música vinha do gramofone emprestado tocando os discos trazidos da Finlândia. Dançavam as danças de salão que estavam em moda na Finlândia naquela época e também ritmos brasileiros, samba, bossa-nova, ritmos internacionais como tango e valsa, e todo tipo de dança. Curiosamente as antigas danças foram preservadas no Clube Finlândia e são dançadas até hoje. E as mulheres finlandesas nunca se preocuparam com a falta de cavalheiros, se não tiver um homem disponível, duas mulheres podem formar um par e dançar animadamente. Já vi até alguns pares de homens dançando no clube.
O baile passou a ser organizado todo sábado a noite. Era o momento esperado para encontrar os amigos, colocar a conversa em dia, se divertir. Todos iam a pé, com a luz do lampião portátil de querosene. O Clube Finlândia era o único lugar que tinha um gerador de energia elétrica em Penedo. Nos dias de chuva andavam descalços pelas estradas cheias de lama, na porta do clube havia um balde para lavar os pés e calçar os sapatos de dança.
Uma curiosidade, a senhora Sanni Lehtola costumava levar seu cachorro para os bailes. Alguém reclamou da presença do cão no baile. Dona Sanni resolveu pagar a anuidade do seu cão, pediu um recibo de pagamento e apresentava para os que reclamavam: “Meu cachorro pode entrar no baile porque é sócio do Clube, aqui está o recibo”. Desde então todos os cães sempre foram benvindos no baile. Alguns gatos também já apareceram nos bailes, mas são tímidos, não gostam de se exibir no meio do salão.
Boa parte das memórias do clube foram imortalizadas no livro "A Saga de Penedo", escrito por Eva Hilden - que dá o nome ao Museu Finlandês - lançado no Clube Finlândia em 1989
O baile também sempre foi aberto para as crianças, nunca houve limite de idade para frequentar o clube, todos levavam os filhos, e as crianças gostam muito das danças do clube. O ambiente é familiar, bem iluminado, todos vão para dançar, quem quer um lugar escuro para namorar deve procurar outro lugar.
Os finlandeses donos das pensões levavam seus hóspedes para o baile. Com o tempo o baile se tornou conhecido na região, o pessoal vinha de Resende, Barra Mansa e Volta Redonda para dançar os ritmos antigos em Penedo. O Clube ficou pequeno, foi ampliado duas vezes até ocupar todo o terreno.
Fotos da visita do Grupo de Danças Folclóricas Turun Kansantassin Ystävät, da cidade de Turku, Finlândia, na comemoração dos 60 anos da Colônia Finlandesa de Penedo (1989).
O Clube também servia de local de reunião para outros eventos. Organizavam reuniões no Dia das Mães, Dia dos Pais, aniversários, serviam café e pulla feita pelas finlandesas. Vários descendentes de finlandeses se casaram no Clube Finlândia, seus filhos foram batizados no clube em cerimônias com a presença de algum pastor da Igreja Luterana da Finlândia. Também organizavam reuniões em homenagem aos que partiram. Certa vez um brasileiro foi encarregado de avisar os finlandeses sobre uma cerimônia fúnebre. O recado recebido foi o seguinte: “Estão chamando todo mundo lá no Clube, é que um finlandês morreu e então eles estão dando uma festa lá no Clube”!
O clube também é usado pela comunidade local, festas de formatura das escolas de Penedo, reuniões para discutir problemas comunitários como plano diretor, abastecimento de água, saneamento básico, segurança. E também apresentações de teatro, música, dança, exposições de artes. Os brasileiros são sempre benvindos e muito são sócios do Clube, nunca foi uma sociedade fechada somente para finlandeses.
Na década de 1970, os finlandeses resolveram construir uma nova sede, com o dinheiro arrecadado com os ingressos compraram um bom terreno onde atualmente é o campo de esportes. Os sócios engenheiros fizeram o projeto e a maquete da nova sede. Mas curiosamente na década de 1980 a diretoria do Clube Finlândia resolveu construir a sede em outro local, o terreno da “Casa Branca”, que originalmente fora adquirido pelos finlandeses para construir residências para os idosos. Não sabemos por que foi decidido assim, nada foi registrado no livro de atas do clube. A nova sede foi inaugurada para as comemorações dos 60 anos da Colônia Finlandesa de Penedo em 1989.
Grupo de danças folclóricas do Clube Finlândia em 1993
O baile de todos os sábados foi realizado ininterruptamente durante décadas. Mas em 2011, a diretoria resolveu reduzir os bailes, inicialmente duas vezes por mês, e depois apenas uma vez ao mês. Desde o início da pandemia em abril de 2020 o Clube Finlândia está fechado, os bailes não acontecem mais.
Que tal organizar um baile virtual apresentado pela TV Penedo?
Helena Hilden